sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Sãos 22:32 e eu estou esperando nossa comida ficar pronta (starving to death). De qualquer forma, achei que seria legal escrever no blog, sendo ele (o blog), nesse momento, um simples objeto, depositário de energias acumuladas dentro de mim devido ao ócio e à fome. Enfim. Expectativas.
Já escrevi aqui uma vez que expectativas são excesso de bagagem (frase pinçada de um livro chamado "Coerção e suas implicações", ed. Livro Pleno, escrito por Murray Sidman. Esta frase não tem realmente muita conexão com o assunto principal do livro [como a sociedade atualmente -e sempre - usa da coerção para controlar os indivíduos. Para quem pensou algo como: "E dá pra controlar sem tolher a liberdade, sem ser coercitivo?", a linha de pensamento que Murray defende, a behaviorista, defende que: 1) não existe liberdade, ela é um mito e 2) nem toda forma de controle é ruim. Exatamente porque não há como o controle ser sinônimo de "prisão", já que não há o quase-antônimo "liberdade"]. Mas as expectativas sempre estão presentes em nossa vida. E isso desde que nascemos e esperamos (não existe um verbo para expectativa? Expectar? Expectativar? Esperar mesmo?) pelo primeiro conforto no colo da mãe ou pelo peito pra mamar, nossa primeira "refeição" -olha eu falando de comida aqui de novo... é a fome.
Só que nossas expectativas nem sempre são preenchidas. E isso desde quando, à noite, choramos de fome e parece que nosso alimento não vem (mãe tem que dormir, um dia eu ainda vou saber disso na pele!). E assim vamos seguindo uma vida de frustrações, e não só de preenchimentos de desejos e vontades: e será que seria bom termos todas as nossas vontades satisfeitas? E, mais do que isso, será que isso é possível? Pois o mundo, e a natureza, se encarregam de nos frustrar, de algum jeito. Seja com uma chuva no dia de Ano Novo, seja com uma enchente que derruba casas, famílias e sonhos.
Bom...
Minha comida ficou pronta! Fui!

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Aproveitando a sesta...



[Imagem: Van Gogh, Noite estrelada - Arles, (1888) óleo sobre tela, Musée d'Orsay]
... e desejando um Feliz Natal pra todos! E que pequenos milagres sejam feitos neste dia e nos próximos que virão.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Cria+atividade



[Imagem: arquivo pessoal]
Há algumas semanas, talvez duas ou três, a capa da revista IstoÉ falava sobre criatividade: o que a ciência diz sobre ela e dicas para desenvolver o seu potencial criativo, deixando-a fluir e se manifestar. Eu não li a matéria toda (benditos sejam os designers de infográficos!), mas eram, no geral, informações que eu já tinha, por gostar de estudar o cérebro humano -ainda que apenas o quanto minha disposição e boa vontade permite.
De qualquer maneira, uma das dicas (na verdade, a peça-chave) para "liberar a criatividade" escrita na matéria é dar-se tempo: ao tentar resolver um problema, por exemplo, parar de pensar nele e se distrair com algo prazeroso, porque a solução surge mais facilmente. Para isso, é preciso primeiro ter um tempo de ócio, por assim dizer, a fim de que as idéias surjam.
Bem, sou muito a favor dessa "técnica" (Essas palavras mecanicistas na verdade me deixam com um pouco de medo e receio, porque um lado meu não quer desvendar os mistérios da nossa mente e de todos os fenômenos que ela "cria", mas não vou me prender muito a esses comentários, pois o texto ficaria todo cheio de aspas).
Aonde quero chegar é ao dizer que este momento de férias é um bom momento pra permitir que idéias loucas surjam, sejam elas relacionadas a projetos profissionais, pessoais, ou a projeto nenhum -que sejam apenas uma boa diversão nessa vida nossa de cada dia, que está tão difícil, mas tão difícil, que Papai Noel já quer ser chamado só de Noel pra não ter que pagar pensão.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Capitu (ou flor cândida e pura)


[Imagem: www.abril.com.br -sei que é meio óbvio colocar os olhos da Maria Fernanda Cândido, mas eu concordo que ela tem tudo a ver com a personagem! E olhem o sobrenome dela e o título da postagem!]
Esta semana está passando na Globo a minissérie "Capitu". Acho que não sou a única a achar que essas minisséries da Globo (como "Hoje é dia de Maria" etc) devem ser muito boas, mas ficam injustamente num horário horrível de se assistir. Confesso que, neste horário e em férias, me encontrarão em frente ao computador, mas enfim: é um horário infeliz e pronto. Eu acabo nunca assistindo mais do que um capítulo -e nunca inteiro.

Mas calhou que, alguns minutos atrás, estava eu escovando os dentes e a minissérie começou. Falou sobre o sacerdócio de Bentinho e, depois, sobre o soneto que ele nunca escreveu, mas do qual escreveu dois versos, o primeiro e o último, numa noite de inspiração. Esta não-realização, talvez menos castigada por si mesmo do que o emplastro (ou a vida sem sentido e sem filhos) de Brás Cubas, não deixou de ser, para a vítima dos olhos de ressaca, uma frustração. O primeiro verso, "Oh! flor do céu oh! flor cândida e pura", e o último "Perde-se a vida, ganha-se a batalha" (logo em seguida trocadas as posições dos versos pelo próprio Bentinho, futuro Dom Casmurro), foram as únicas partes que ele conseguiu escrever de um soneto.

Eu me lembrava direitinho desta parte do livro (que, confesso com a maior vergonha, nunca terminei de ler). O motivo? Não sei exatamente, mas talvez seja porque, metida a "aventureira de papel e lápis" que sou, na época me coloquei a ajudar Bentinho e aceitar sua oferta: completei o recheio do soneto, exatamente nos dias 16 e 17 de março de 2002 (!). Espero que ninguém entenda isso como uma heresia ou algo assim, foi só para me divertir mesmo.


Soneto para olhos de ressaca

Oh! flor do céu oh! flor cândida e pura!
Contigo novamente à noite sonhara
e te faço ser pra sempre uma ave rara
nesta fonte inesgotável de loucura!

E como prova desta vil amargura
pois tão longe me encontro, e o som dispara
deste sino, ao sacerdócio a mãe mandara
sem poder contemplar-te a formosura,

escrevo-te estes versos sem saúde...
perdoe, musa, a simetria toda falha-
que falta faz o tocar do alaúde!
Mas digo que, pra não vestir essa mortalha,
e expirar pela metade, sem gozar da plenitude,
ganha-se a vida, perde-se a batalha!

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Lixo psíquico (ou mensagem de fim de ano)


[Imagem do site www.jbrj.gov.br]
O termo "lixo psíquico" é de Maria Elizabeth Pacual do Valle, e o encontrei num livro chamado "Grupoterapias: abordagens atuais", de Luis Carlos Osorio. Copio aqui um parágrafo, em que ele fala do profissional que tem que cuidar do outro (psicólogo, médico etc), mas que vale pra todo mundo:

"Por lixo psíquico entendemos tudo aquilo que é reprimido, não expresso ou acumulado sob a forma de ressentimentos, angústias e frustrações e que irá poluir nossa relação com os outros e intoxicar nossa mente. Aquilo, enfim, que faz com que, em nosso cotidiano, haja mais sofrimento do que o inevitável e que decorre, por exemplo, do modo como exacerbamos nossos sentimentos de culpa, superdimensionamos nossos erros, incrementamos a auto-piedade, focamos nossa atenção no que de negativo nos acontece ou ainda transformamos a admiração em inveja, a competição em rivalidade ou opiniões divergentes em hostilidade. Dizendo de outra maneira, é a sobrecarga que adicionamos ao que é o fardo cujo transporte é inerente à tarefa que realizamos"


É, gente... Nessa era em que nossa bandeira é a ecologia, nada melhor que começar limpando nossos próprios lixos psíquicos! É essa minha mensagem de fim de ano letivo (que, aliás, foi meu último...) Beijos.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Poesia de outro (ou Ouçam Little Joy)


Evaporar (R. Amarante)


Tempo a gente tem

Quanto a gente dá

Corre o que correr,

Custe o que custar...


Tempo a gente dá

Quanto a gente tem

Custa o que correr,

Corre o que custar...


O tempo que eu perdi

Só agora eu sei

Aprender a dar

Foi o que ganhei


E ando ainda atrás

Desse tempo

Tempo de não correr,

Nem de me encontrar,


Ah... não se mexer!

Beija-flor no ar

O rio fica lá

A água que correu

Chega na maré,

Ele vira mar...


Como se morrer

Fosse desaguar!

Derramar no céu,

Se purificar...


Ah... deixar pra trás,

Sais e minerais,


Evaporar...
[PS: a fotografia é minha]

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Eu tinha que escrever (ou Janta)


Há vários motivos ideológicos para eu não escrever sobre isso; mas também há um único que foi o predominante para que eu decidisse escrever - o tema, o que também é, de certa forma, ideológico. Claro que, somado ao tema, há também meu interesse pessoal por pelo menos um dos dois integrantes - não posso dizer que haja uma "conexão", pois ela implicaria dois envolvidos, mas posso dizer de uma "ligação unilateral", se é que isso é, por sua vez, possível. Na verdade, pensando melhor, há uma conexão sim: ele me transmite algo, que eu tento lhe devolver da forma mais abstrata e intuitível que existe, no meio do coletivo das milhares de pessoas que sentem como eu o que de tão bom ele nos passa.
Enfim.
O tema -que é o Amor, nada mais e nada menos -. nunca passa incólume (é a segunda vez que uso essa palavra no blog; a primeira foi na postagem chamada "Saudade", que, por coincidência, é o mesmo nome de uma música dele que estou ouvindo agora). O Amor pode despertar estranhamento, medo, furor, raiva, ciúmes, inveja. Parece ser (só parece, pois os poetas tentam defini-lo quase que em vão) um sentimento de calmaria que é resultante da anulação das energias tão intensas dos demais sentimentos que ele causa. E, claro, o Amor mais desejado, o que abalaria as estruturas do viver social, é o mais rejeitado.
Já li e ouvi comentários de todo o tipo, inclusive de que a relação entre eles é de uma violação do mais velho - que talvez estivesse juntando bagagem para receber um novo amor, um amor novo como o dela - para a mais nova - que foi menos maculada pelas dores e pelos calos, e que ainda é capaz de chorar de alegria, de transbordamento de Amor puro, como elamesma disse. Mas a violação (e a violência) ocorre quando um lado é forçado a fazer algo que não quer; e o lado que não quer, o lado vítima, é o do Amor; o verdadeiro cometedor de violência é o lado das opiniões cheias de paixão furiosa, que não aceita que esse próprio Amor está dentro de si.

domingo, 16 de novembro de 2008

Top 7 Vozes sexy (ou opinem)

Já foi comprovado pela ciência, mas toda mulher sabe que, na verdade, isso nem era necessário: algumas vozes masculinas simplesmente mexem com nosso mais interno interior (isso mesmo que você leu)!
Cada uma deve ter seus timbres preferidos, e esses são alguns dos meus (claro que posso ter esquecido de alguns, fiz essa postagem rapidinho):


7) David Lee Roth (ex-Van Halen)


6) Steve Tyler (Aerosmith)


5) Mark Kopfler (Dire Straits)


4) Julian Casablancas (The Strokes)


3) Bruce Springsteen


2) Chico Buarque


1) Amaranteee! (antes, Los Hermanos... agora, Orquestra Imperial e Little Joy)



Opinem, mulheres... e homens também!

domingo, 9 de novembro de 2008

Querido blog (ou lorota)

Querido blog,

Peço desculpas por minha negligência para contigo. Sei que estou devendo algumas postagens fresquinhas e inspiradas, do jeitinho que você gosta, mas é que ultimamente a vida anda caótica (quando não anda?, você pode me perguntar, e eu respondo humildemente que você tem toda razão, mas tenha calma, por favor, e leia a seguir), final de ano é essa dureza mesmo, e agora ainda tenho o final também da faculdade, da minha vida como estudante universitária, da minha rotina, dos dias estudando no campus e comendo pão doce no Benja... Enfim. São muitos lutos pra lidar de uma vez só! Viu? Falando assim, talvez você seja capaz de me entender. Está difícil, juro, não estaria eu aqui me explicando se não tivesse argumentos que justifiquem ao menos um pouquinho esta falha enorme que é dar esse chá de sumiço em você. Desculpe. Tenho percebido -você achou que eu não notaria, né? - que você tem demorado pra carregar sua página aqui no meu computador. Às vezes, até trava e aparece aquele avisinho do Internet Explorer que executou uma operação ilegal e precisa ser fechado. Mas pode ficar tranqüilo e parar com esses atos rebeldes, eu logo volto! Isso se eu não ficar louquinha de pedra antes e começar a falar com seres inanimados... será??

Beijos

Emy

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Elela (ou Elele)


[Imagem: Joan Miró, "O belo pássaro revelando o desconhecido a um par de amantes" 45,7x38 cm, 1941]


Ele nasceu de parto normal. Ela, de cesárea. Ele falou "mamãe" aos dez meses. Ela, "papai" aos nove. Ele brincava com os amiguinhos do prédio. Ela, com os imaginários. Ele queria ter a barba do papai. Ela pedia barbie pra mamãe. Ele só gostava do recreio. Ela, da aula de desenho. Ele aprendeu a ler aos sete. Ela, aos três e meio. Ele beijou uma coleguinha no escorregador. Ela esperava seu príncipe no balanço. Ele repetiu de ano na quarta série. Ela foi aprovada com louvor. Ele tomou um porre. Ela ganhou um perro. Ele estourou uma bomba no banheiro e foi expulso. Ela ganhou uma bolsa de estudos. Ele fez karatê, pra extravasar a energia. Ela, natação pra acompanhar as amigas (e ver os rapazes do colegial). Ele foi trabalhar com o pai. Ela fez intercâmbio na Europa. Ele conheceu prostitutas da Augusta. Ela namorou um italiano. Ele aprendeu a dirigir um carro. Ela era a favor da bicicleta. Ele conheceu um bom amigo. Ela foi pra faculdade. Ele foi fazer teatro. Ela já fazia. Ele. Ela. Ela pensou: interessante. Ele: bem gata. Ela foi pra direita. Ele não ia, mas foi. Ela pediu um chá gelado. Ele, um chope uruguaio. Ela gostava de piano. Ele, de violão. Ela ouvia bossa nova. Ele, rock antigo. Ela mordia o canudo pra beber. Ele detonava o copo em três goles. Ela evitava gordura trans. Ele, legumes no vapor. Ela tinha ansiedade. Ele, insônia. Ela beijava de olhos abertos. Ele lhe puxava os cabelos. Ela morava mais perto. Ele não tinha hora pra chegar. Ela preferia ficar em cima. Ele, em baixo. Ela se despedia com beijinhos. Ele, com um beijão.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Rap do poema

"Faz tempo que não faço poesia
(Poesia, palavrinha tão vazia
parece mais uma bexiga cheia
-mas não era vazia? - de ar)

Resolvi escrever sem rascunho
sem papel, caneta ou punho
nem graveto na areia,
vim direto digitar.

Pois na era em que estamos
décadas viram como anos
há muita pressa, minha gente!
Que estou fazendo aqui?

Ah, sim. Vim poesiar postagem
Que é de hoje a mensagem
um tanto quando indecente
do infinito de Emy."


(22/09/2008)

sábado, 20 de setembro de 2008

"51, uma..."


Vejo as propagandas políticas e fico pensando que fim levou a arte da propaganda. Não que eu seja uma entendida disso (amigos meus, como a Rê do blog que eu recomendo aí do lado, poderiam falar muito mais sobre este assunto), mas a verdade é que as boas idéias sempre me atraíram. E -imagino eu- propagandas tinham, inicialmente, a finalidade de convencer alguém através de boas idéias. O que defino como boas idéias? Não as classifico através de um olhar da ética ou da moral, mas simplesmente da capacidade criativa, da inteligência, da poesia. "Boa idéia!", costumava-se dizer.

Acontece que, em meio a comícios, paródias de músicas sertanejas e carros visualmente poluídos, algumas frases me chamam a atenção -nenhuma em especial, pois são todas parecidas. Me chamam a atenção porque nelas não vejo nada mais do que a tentativa de atrair o público a qualquer custo. E o caro preço a ser pago, além da falta de criatividade que define uma "boa" idéia, envolve também a ética e a moral que definem uma idéia "boa".

Não gosto de ser pessimista, mas duvido que haja veracidade e autenticidade numa só frase daquelas. Duvido que elas tenham realmente saído da boca do fulano cujo nome está em cima de tais palavras. Em alguns casos, duvido até mesmo que ele tenha ao menos as lido em um papel e aprovado antes que virasse adesivos ou faixas.

Na verdade, não são só as propagandas políticas que mexem comigo, são as propagandas em geral. Trata-se da venda das idéias -e, aqui, é legal a gente pensar nesse termo: "venda das idéias". A palavra "venda" pode ser do verbo vender, mas também pode ser um pedaço de pano que amarramos sobre os olhos, nos impedindo assim de enxergar.

Palavras mexem com a gente. Gente é feita de palavras. Palavras são armas. E penso se ainda há tempo para fazermos algo a respeito -e tratarmo-nas (as palavras) com respeito.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Mi Confesión (ouça Gothan Project)

[Imagem de Beatriz Milhazes -aliás, ela está na Estação Pinacoteca até novembro, não percam]



Minhas confissões, escritas no título, se referem a um lado particular de minha vida: o lado relacional. Minha relação com o outro. Estou cheia de dedos pra escrever, pois é difícil, mais difícil do que parece colocar ao mundo através da linguagem escrita uma confissão dessas. Para alguns, deve ser bem mais fácil.



A questão é: estou apaixonada. Agora que o escrevi, errando diversas vezes a digitação da palavra “apaixonada” (agora acertei de primeira), é um pouco estranho. Soa exagerado. Parece até mentira. Mas, no fundo, imagino que não o seja. Sei que não é, porque conheço os sintomas. Já me apaixonei diversas vezes. A diferença é que... agora é diferente. É isso. Vou tentar explicar.



Tenho uma noção do por quê posso dizer que agora é diferente. Não é porque é a primeira vez que sou correspondida, ou o oposto disso –não mesmo. Já fui diversas vezes pega pelo platonismo, aquela paixão mais do que idealizada, projetiva. E não tenho a pretensão de achar que, dessa vez, o padrão esteja muito longe do habitual. Não, não. As listras podem não ter as mesmas cores, mas ainda são listras. Também já tive o prazer e os desprazeres de ser correspondida. E, claro, o eu nisso tudo nunca foi igual. Eu fui transformada por minhas paixões. E é este um dos motivos por quais considero que agora seja um pouco (mais) diferente.



Uma de minhas paixões correspondidas cresceu, viveu sua intensa e curta vida como adolescente inconseqüente, envelheceu e se tornou amor. E este amor, posto que é chama, era pouco e se acabou. Não duvido que, na verdade, eu esteja escrevendo tudo isso porque essa dor da queimadura que se tem quando um amor acaba (consigo mesmo e com muitos outros colaterais) ainda dói. “Falar do que foi pra você não vai me livrar de viver” –é isso o que estou ouvindo, aleatoriamente pelo destino, agora. E a dor se aproxima pisada a pisada com meu aniversário, é inegável. Acabei de ver que, na data que se encontra no subtítulo*, eu havia digitado 2004 ao invés de 2008. Não deve ser mentira, o inconsciente existe, explique-o como quiser. Mas falar de psicologia seria falar de outra paixão. Voltemos ao assunto.



Não quero falar do quanto tive que amadurecer durante minha passada pelos quadros de Munch. Eles não são fáceis, apesar de tão instigantes pra mim. Acabo voltando a eles, de vez em quando, por simples prazer, mas somente a passeio, não para me instalar de modo tão desconfortável e forçado, exilado, como naquela época. Época que, aliás, fez o primeiro aniversário dez dias atrás. Sim, assim como Anna O., que vivenciava o passado no presente, parece que um pedaço de mim o está fazendo agora.



Mas os caminhos sempre têm um preço –e, quando você dá mais pelo tíquete, recebe o troco. No meio de tudo isso, dei uma folga pro lado negativo da distimia que sucede um evento enlouquecedor, me rendendo à mania pelo menos por algumas horas, escravas ensandecidas –como eu- da noite. E foi aí que, que sorte a minha, encontrei um outro alguém. Eu não sei, graças a Deus, porque seria muito chato sabê-lo, que conjunções místicas e astrológicas estavam sendo realizadas naquele momento. Só sei que Baco ajudou muito neste encontro. Sim, eu estava bêbada, maníaca. E por isso que foi tão bom. Mas, apesar da embriaguez, algo me dizia, apesar do medo, que aquele encontro não era à toa, ele viria a me dizer algo mais. E, aos trancos e barrancos, realmente tem me dito, ainda agora, quase nove meses depois.



Por que aos trancos e barrancos? É este o meu desespero único nessa aventura nova em que tenho me... bem, me metido. Aprendi a não falar com estranhos desde pequena. E quem são estranhos? São pessoas a quem não fomos apresentados, ou seja, de quem não sabemos o nome. Pois a situação em que estou, com esse outro alguém, é uma situação na qual, por essa lógica, também não devo confiar, visto que tampouco me foi apresentada previamente ou foi, por algum batismo posterior e consensual, nominada.



Jamais imaginei me colocar neste tipo de relação, mesmo porque, com o amor que me tinha, eu já não pensava que teria um dia que estar em outra relação. E é bom agora saber que mudanças nos planos não dependem apenas de nós, elas exigem o que não somos capazes de dar por conta própria. Não somos mais donos do nosso destino a partir do momento em que a vida implica a presença de mais alguém. E, mesmo assim, a soma de um e um outro é ainda maior do que dois. Tendo este dado guardado em meu bolso, me arrisco a experimentar.



E como! É uma nova qualidade, nem pior nem melhor (por mais que eu tenda a comparar), de encontro. Envolve, sim, o tato, a visão, a audição, o olfato e o paladar – a sensualidade em seu sentido mais puro, impuro, imundo, mundano, humano. Envolve uma atração física e espiritual que me revigora, apesar de tender a me atar em correntes, já que muitas vezes até me tira o sono. São as velhas listras...






(* texto adaptado)

domingo, 7 de setembro de 2008

10 Verdades Inconvenientes

[Imagem achada na internet]


1) Temos uma relação de amor e ódio com a rotina;
2) Homens e mulheres pensam, agem e vivem diferente;
3) Vovós são meigas e amadas porque não têm mais TPM;
4) Até o mais anárquico é simples reflexo de sua cultura;
5) Psicoterapia não é pra qualquer um ;
6) É fácil mentir no MSN;
7) Os Los Hermanos são os Beatles brasileiros ;
8) Expectativas são excesso de bagagem*;
9) A ciência é a base da verdade, mas tem ossos fracos;
10) Todas as verdades acima são questionáveis... mas eu duvido.


(*OBS: esta frase não é minha, é de um behaviorista chamado Murray Sidman. As outras são)

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

I´m still here

Yo solo quiero decír que aún estoy aqui y que no que he olvidado de mi blog. A los lectores y amigos (y a yo misma), ya vuelvo. Es que mi libido no está tan direccionada a unas cosas que amo hacer tal como escribir.

I just wanna say that I´m still here and haven´t forgotten my blog site. To the readers and friends (and to myself), I´ll be back soon. It´s just that my libido is not so directed to some things that I love to do like writing.

Acho que esta frase de cima é apenas uma auto-afirmação. De toda forma, aviso a todos, inclusive a mim mesma, que logo voltarei a postar aqui. Já estou com várias idéias, só não estou com a libido direcionada para escrever...

quinta-feira, 31 de julho de 2008

Meninos não sonham

[Imagem: "Sonho causado pelo vôo de uma abelha à volta de uma romã, um segundo antes do despertar", 1944, Salvador dalí, óleo sobre tela, 51x40,5 cm. Lugano-Castagnola (Suíça)]

Depois de ter aulas sobre a teoria de Jung, há dois semestres, plantei e estou cultivando uma idéia um pouco louca -e que, óbvio, provavelmente não colocarei em prática (como já não estou).


Meu professor odiaria ver suas palavras tomadas tão ao pé da letra assim, mas de qualquer forma não vou identificá-lo. Este professor "X" dizia que os sonhos (os sonhos mesmo, aqueles que temos quando dormimos, e não os que temos quando estamos acordados) são indícios da nossa vida psíquica, ou seja, eles refletem o que temos ali dentro, nos recônditos do inconsciente. Assim, pacientes que costumam sonhar bastante são aqueles de mostram uma maior riqueza psíquica, têm mais "recheio na cachola". E com esses é mais fácil trabalhar com metáforas, com sonhos, com associações livres. Jogando mais pesado, são pacientes que aproveitam melhor a técnica da psicanálise e a psicologia analítica, simplesmente porque é meio como se já tivessem os instrumentos necessários pra brincadeira.


Faz sentido se pensarmos que os sonhos têm a ver com o que pensamos durante o dia e que as mulheres geralmente se lembram mais dos sonhos do que os homens. Ora, nós geralmente pensamos muito mais sobre questões emocionais, psicológicas, pensamos em nós mesmas, em como melhorar como pessoas. Já a maioria dos homens, bom... Claro que conheço alguns -muito sensíveis - que sonham. E é nisso mesmo que tudo faz sentido.


Enfim, o que concluí disso tudo, juntando aos pensamentos meus de cada dia, é que, pra achar um cara legal e que valha a pena (leia-se um cara suficientemente sensível pra entender ao menos aquelas explicações esdrúxulas que a gente costuma dar quando fica brava do nada, ou tem um surto e começa a chorar, não necessariamente na TPM), já há uma maneira cientificamente (Psicologia é ciência?) comprovada: você inclui, na lista de assuntos para uma primeira conversa, a seguinte pergunta - "Você tem muitos sonhos à noite? De que tipo?"


Exemplos de respostas e o que você deve fazer:

1) "Não, nunca sonho!" - esqueça.

2) "Sonho sim, mas nunca lembro o que era" - tente forçar um pouquinho, senão... esqueça.

3) "Sonho de vez em quando, principalmente de quarta-feira, depois do jogo. Sonho com o Timão!" - você tem pelo menos três motivos pra desistir: o sonho é muito raso e não diz nada do inconsciente dele; o certo é "às quartas-feiras", e não "de quarta-feira"; e Timão? Sem comentários...

4) "Sonho direto, cada dia um sonho diferente. Essa noite sonhei que estava galopando em um unicórnio, segurando seu chifre, e entrando num lugar cheio de coisas grandes e pontudas..." - Er... eu não arriscaria. Motivos quase explícitos. But take your chance.

5) "Sim, tenho alguns sonhos interessantes. Te conto a caminho de casa" - Uhu! Quão moderna você é??


A questão é: todo cuidado é pouco. Se podemos ter às mãos mais uma arma que seja, então que a tenhamos.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Time to say goodbye (ou brincos)


Época de férias sempre acaba nos impulsionando a fazer uma faxina geral nos nossos pertences (materiais ou não), reciclar, ter vontade de doar o que já não é mais nossa cara. Talvez isso aconteça porque é na época de férias que estamos mais leves (mesmo que a gente coma mais): é uma leveza de espírito, que acaba naturalmente despregando de nós algumas coisas que ficam presas pela própria retesão dos músculos que se congela no dia-a-dia.
Enfim, motivos à parte, hoje eu estava arrumando minhas gavetas e comecei a ver meus brincos. Olhando um, olhando outro, acabei me esquecendo completamente das gavetas e dediquei meu tempo e minha concentração a ver esses brincos -e a escrever aqui no blog. Tanta coisa pra fazer! Foco, Emy.
Pensei em começar esta postagem dizendo que a foto aí mostra o 'infinito dos brincos de emy'. Mas logo vi que seria injusto pois, depois de tirar as fotos, lembrei que tinha uma caixa de brincos dourados e mais alguns em outras gavetas que não saíram na fotografia. Então, o tal do título ali em cima seria mentiroso. E colocar os brincos restantes ali daria muito trabalho -pois eu já tinha separado uma parte destes brincos aí para jogar fora. E talvez não coubesse num enquadramento legal.
A questão é essa: uma atividade que poderia durar apenas alguns minutos acabou se estendendo muito, pois estes brincos têm quase todos uma história da qual me lembrar: fosse dos lugares aonde fui usando algum par, fosse porque foram presentes de alguém querido. Ou fosse simplesmente por remeter à sensação de apaixonamento que tive quando escolhi algum deles pra comprar na loja (isso parece fútil -e talvez seja-, mas faz parte de mim e de minha história gostar do que brilha, do que reluz, do que é belo. Se alguém souber explicar, fique à vontade).
É realmente verdade que um objeto com algum valor sentimental pode nos fazer ter sentimentos até então escondidos, guardados. Sejam eles sentimentos de alegria ou de tristeza, de saudade ou de nostalgia etc etc ad infinitum. Talvez por isso o nome: valor sentimental. Os sentimentos têm valor, e essa verdade é tão concreta quanto os objetos em questão.
Por outro lado, como eu havia dito no primeiro parágrafo, às vezes é hora de dizer adeus e nos desprender. Com certeza, haverá outros motivos para recordar. Foi isso que fiz logo depois: escolhi vários pares para jogar fora, pois sabia que não os usaria mais. You bet que eu acabei mudando de idéia e guardando mais do que poderia guardar, simplesmente pela dificuldade de jogar fora a representação de bons sentimentos que são estas bijuterias. Já na sacola de plástico, pensei em doar alguns e acabei fazendo uma "repescagem", salvando alguns. Também dei um "banho de pasta de dente" em dois ou três pares, e eles ficaram novinhos em folha. Mas consegui, sim, dizer adeus a um número considerável. Adeus. Snif.
(PS: na foto, há três brincos sem par. Se alguém conseguir achar... escreva)

terça-feira, 15 de julho de 2008

Pílula de pensamento 2


Cada um de nós é como um pacotinho de Confeti: temos dentro de nós, potencialmente, uma enorme gama de cores, das mais vibrantes às mais acinzentadas, porém cada um traz uma proporção diferente dessas cores. O sabor deve ser o mesmo, independente da cor, porque viver cada dia -seja ele triste ou feliz -deve ser como comer chocolate: uma grande viagem. Só não exagere.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Uma análise psicológica de Amy Winehouse

[Caricatura de Stevero, no site desenholegall.blogspot.com]

"Understand,
Once he was,
A family man.
So surely,
I would never,
Ever go through,
It first hand
Emulate all
The shit my mother hated.
I can't help,
But demonstrate
My Freudian fate." (Amy Winehouse, "What is it about men")

Eu, assim como os milhões de fãs da Amy -e também os puros voyeuristas e sádicos -acompanho quase todas as notícias de quando ela dá vexame em show, ou é flagrada usando drogas, ou declara amor pelo marido preso, ou é levada pelo pai a uma clínica de reabilitação ("yes, yes, yes"). Imagino que muitos e muitos blogs tenham alguma postagem falando sobre ela, e meu Infinito não vai ficar pra trás. Mas pensei em fazer algo que está mais à minha alçada: uma análise psicológica de Amy Winehouse.
(aviso que, obviamente, essa análise é mais pra entretenimento do que pra qualquer outra coisa que caberia a um psicólogo... don´t take it too seriously!)

Primeiro de tudo, algo óbvio: existe algum conflito edípico que não foi suficientemente resolvido. Complexo de Édipo total. Pra quem não sabe, Freud usou o mito do Édipo-rei pra mostrar a relação que se forma com nossos pais quando somos bebês. O filho ama a mãe e sente raiva do pai por este já ser o dono dela, então só lhe resta procurar outra mulher para si e tentar ser parecido com o pai para achar uma mulher parecida com a mãe. No caso da Amy, parece claro que, no fundo, ela ainda quer muito o carinho, a atenção, o amor do pai. É ele quem ela busca quando está na pior (e olha que não são raros momentos não!). É o Sr. Winehouse quem socorre a filha, conversa com ela e a convence a se internar, é ele quem a protege da mídia, é ele quem a abraça pra entrar no carro. Por isso Amy, inconscientemente, buscou um marido que não pode estar com ela (o Blake está cumprindo pena na prisão): assim, o pai pode cuidar dela sem ninguém inconveniente-como um marido -para atrapalhar. Ela faz declarações para o Blake porque ele é o marido que ela queria: um marido que está lá, preso, e não perturba.

O abuso de álcool (seu próprio nome já diz: Winehouse=em inglês, casa de vinho, adega; e Amy=do francês ami, amigo) e drogas é uma conduta anti-social que, segundo Winnicott -um psicanalista que estudou a delinqüência-, é uma forma da pessoa dizer ao mundo que algo lhe foi privado, que não lhe deram algo de que ela precisava. Nesse momento, pergunto onde está a mãe da Amy. Nunca ouvi falar dela em nenhuma notícia: é viva, é separada do pai, fugiu de casa? O que faltou em sua vida que ela reclama através do uso de drogas? Pode ser a falta de uma mãe carinhosa, mas, partindo da hipótese de cima, pode ser também que o que lhe faltou foi justamente uma interdição, ou seja, uma mãe que dissesse: filha, você não pode ficar com seu pai pra sempre.

Quanto a suas letras, Amy apresenta um intenso sentimento de desesperança, beirando o cinismo. Isso se mostra, por exemplo, na letra da mais que conhecida"Rehab": The man [=o psiquiatra da clínica] said why you think you´re here (...) He said I just think you´re depressed, kiss me and go rest. Ou seja: não há crédito nenhum numa ajuda psiquiátrica ou psicológica. Isso demonstra que a Amy aproveitaria pouco de um trabalho de terapia. Chamamos isso de mau prognóstico.

Por outro lado, há uma esperança: a própria música. Freud denominou 'sublimação' o ato de deslocarmos energia para o fazer arte. É uma forma saudável e socialmente aceitável de, digamos, engolir sapos (poderíamos, ao invés disso, gastar compulsivamente ou então até matar alguém, mas a sublimação nos salva!). A saída para Amy dar conta de todas as angústias e 'terrores-sem-nome' que a atormentam só parece estar na concentração em criar canções ótimas como as que ela tem feito. E, quanto a nós, fãs, só nos resta torcer para que dê tudo certo. E que a Amy até vá de volta para o escuro, mas que ela retorne ao claro todas as vezes.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Contando um quadro (inspirada em Veríssimo)

[Imagem: "A cama", Henri de Toulouse-Lautrec, 1892. Óleo sobre tela, 71x54 cm. Museu D´Orsay, Paris, França]

Ele pra ela:
- Ô, meu amor...
- Arnaldo...
- Diga.
- Posso te pedir uma coisa?
- Claro, meu amor! Sou todo ouvidos!
- É que esse "meu amor" que você fala... "meu amor" não pode.
- Por que?
- É que me lembra o Zé Roberto.
- Seu ex?
- É. Ele me chamava assim.
- Tá bom. Deixa eu pensar em outro nome. Coração.
- "Coração" também acho que não.
- Por quê? O Zé também te chamava assim?
- O Zé, não. Mas o Edílson, sim.
- Quem é Edílson?
- Meu ex-ex. Durou pouco, mas ele me chamava assim. Coração.
- Ok. Deixa eu ver outro. Doce-de-coco.
- Hmm...
- Também não?!
- Também não.
- Quem era dessa vez?
- O Fábio. Ah, ah, ah. Um dia eu disse que era louca por cocada, aí ele começou a me chamar de doce-de-coco...
- Ok, ok. Bombonzinho, então.
- Também não rola.
- Outro ex?
- Não, também era o Fábio. Eu adoro cocada e bombom. Terminamos porque ele era diabético.
- Hm... Gatinha?
- Não. O Fernando... ex-ex-ex. Veterinário.
- Linda?
- Geraldo. Primeiro amor. A gente nunca esquece.
- Princesinha.
- De jeito nenhum.
- Caramba! Qual ex te chamava assim?
- Nenhum ex. Meu pai mesmo.
- Pô, Paulinha! Cansei!
- Que Paula, o quê! Meu nome é Mariângela!

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Neuro+ótico


"Quero renovar meu mundo
Onde o tudo é sempre quase nada.
Quero girar pelas calçadas,
andar de mãos dadas com a solidão.
Quero dançar com sapatos
e ouvir os vibratos dos boêmios fugazes.
Não quero mais olhar pra trás,
nem chorar com o que deixou de ser
- quero mais é envelhecer
amadurecer minha concepção.
Quero bancar meus desejos,
aceitando os beijos que me trazes.
Quero as pazes de corpo e alma
ter na palma da mão meu perdão.
E assim eu sei de cor
que minha cor não voltará ao branco
não importa o tanto de alegria que vier.
Mas posso criar um novo tom
mudar o meu batom
e ser uma outra mulher."
(02/06/2008)

domingo, 4 de maio de 2008

Alegría

[Imagem: Francis Bacon, "Raiva" (detalhe)]

Hoje fui assistir ao Cirque du Soleil. Estou com o programa em mãos e achei legal copiar esta parte para todos. As maiúsculas fui eu quem destacou porque é minha forma de gritar hoje.


"Formoso grito delinqüente, muito obrigado.
Muito obrigado aos fazedores de regras. Aos quebradores de costas. Aos autocratas sinceros. Aos falsos democratas. Aos construtores de paredes. Aos pintores de linhas. Muito obrigado. Muito obrigado novamente. Aos tatuadores de números. Aos que apontam com o dedo. Aos que calculam sua usura. Aos que separam por cor. AOS QUE MENTEM SORRINDO. MUITO OBRIGADO. Por favor, dêem um passo à frente, em direção aos refletores. Deixem-se fotografar para a posteridade. Para agradecer a todos vocês. DEIXEM-NOS REGISTRAR SEUS ROSTOS EM NOSSO ÁLBUM DA INFÂMIA. PARA QUE NUNCA ESQUEÇAMOS. PARA QUE NUNCA ACEITEMOS. Viva a Alegría!"

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Pr´um dia de chuva como esse...


"Você pensou que nosso amor
era repleto de certezas,
mas de perto de mostrou
toda estranheza ao meu redor.

E o que antes me era o ser
algo sem eira nem beira se tornou,
mais rápido que o dia de Natal.
Só me fez ver que não era pra ser,
que o calo que eu sentia
não era natural.

Não foi por mal, vai ser pro bem.
E antes que diga meu nome,
tua fome será de outro alguém.

Faço as malas sem complicação
que meu coração está a me
esperar lá fora. Vou embora.

Você vem insistir e
escuta o que
não quer ouvir."


(novembro de 2006)

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Sex and The Sims


Li no UOL que pesquisa do Datafolha (http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u393902.shtml) mostrou que quatro em cada dez filhos não foram planejados, sem contar os casos de aborto. É um dado interessante pra viajar.

Imagine sua salinha da pré-escola: dos seus 20 coleguinhas, oito não tiveram um esboço antes da arte-final. Na linguagem psicanalítica, não foram "bebês fantasmáticos", ou seja, não viveram primeiro na imaginação da mãe e do pai, não foram concebidos pelos desejos e pelas fantasias dos progenitores antes de vir ao mundo real (/ virtual?). Mais estranho ainda pensar se você faz parte dessa turma dos oito.

Indo pra faculdade, então: dos 60 colegas da sala, 24 também não foram rascunhados. É bastante gente. Imagine a sala sem eles.

Imagine um estádio de futebol sem esses 40%.

Imagine o Brasil.

Imagine a China.

Imagine o mundo.

Como é que seria? É fato de outras pesquisas -e do senso-comum também - que a criança planejada tende a ter maior cuidado e estrutura pra ser recebida, tem uma vivência inicial de vida (vulgo infância) mais feliz e, se tudo der certo, tem base para poder transmitir este exemplo pra sua prole.

Não deixo de lembrar de um cara interessante chamado Donald Winnicott que falava que a conduta anti-social era uma forma da criança ou do adolescente reivindicar algo que lhe foi roubado. No senso-comum, é o tal do "querer chamar atenção". Cada vez que penso nisso, mais acho que o Winnie tinha razão.

Eu, sinceramente, muitas vezes sou a favor da qualidade em prol da quantidade. Acho que controlar e criar filhos não é fácil como no The Sims -e olha que lá nem sempre é fácil também (tente criar gêmeos sem sofrer ameaça da assistente social de vir buscá-los porque você não os alimentou de madrugada).

Não que reduzir o planeta em 60% da "carga" atual seja a solução final para todos os nossos problemas.

sábado, 26 de abril de 2008

Mais fácil aprender japonês em braile (ou confissões)

Essa semana aconteceu algo diferente comigo (na verdade, se a gente ficar atento, vai ver que todo dia acontece algo diferente com a gente, é só ter essa expectativa -e perspectiva). Eu entrei no ônibus 118C Santa Cecília, como faço três vezes por semana. Fui pro fundo do busão, e tinha um carinha sentado e sorrindo pra mim. Na verdade, achei ele um pouco estranho na hora, por um átimo de segundo confesso que tive medo -o que é normal de sentir no transporte público. Mas aí senti que era um sorriso simpático, genuíno. Então fiquei parada ao seu lado. Ele logo estendeu as mãos, se oferecendo para carregar minhas coisas. Entreguei minha pasta e agradeci, distraída. Passam alguns segundos, e ele começa a fazer uns ruídos meio alto: "Uhn- ahn-ãohn?". Pensei que ele tinha algum déficit mental. Ele então começou a fazer gestos, puxar os olhos e depois escreveu com o dedo na minha pasta: 'Japão'. Entendi, respondi que era descendente de japoneses. Foi aí que entendi que ele era surdo-mudo.

Daí até o ponto que desço, fomos nos comunicando: ele perguntou se eu tinha namorado e por quê não; perguntou se eu morava por ali e contou onde morava; perguntou se eu tinha orkut (essa foi difícil de entender!) e disse que tinha. Ele estava acompanhado de uma amiga também surdo-muda, e de vez em quando eles se falavam por gestos. Senti que o pessoal do ônibus estava interessado no papo que rolava entre nós, mas ninguém falou nada, e eu também sou tímida o suficiente para não ter olhado pra ninguém. Chegamos ao ponto do metrô, muita gente saiu, a porta se fechou. De repente, os dois, a amiga e ele, saíram correndo e gritando coisas 'ininteligíveis' (?) ao cobrador, que mal olhava para eles. Eu também não estava entendendo muito bem, estava confusa assim como todo mundo, até que uma senhora gritou: "Pelo amor de Deus, gente, abre a porta, eles querem descer!". A porta se abriu, e eles nem souberam que foi a mulher quem os ajudou -porque ela não estava em seu alcance visual.

Confesso que me senti realmente mal por não ter entendido o que eles queriam, nem podido assim ajudar. Mas acho que esse meu sentimento veio principalmente porque, de alguma forma, me senti na obrigação de retribuir a alguém que me ajudou não só a carregar meus pertences, mas também me fez ver que, muita vezes, os surdos e mudos somos nós -nós, os do "lado de cá".
E que raios de comunicação é essa, truncada ou inexistente, que muitas vezes preferimos estabelecer com o outro? Só não se comunica quem não quer. E quem quer? Não está fácil pra ninguém, mas às vezes o lado que tem mais dificuldades é o que persevera.

sábado, 12 de abril de 2008

de onde vêm as coisas


[Imagem: "Ninféias", Claude Monet, óleo sobre tela, 130x200cm, ano?]


Hoje minha cabeça está bem bagunçada. Não sei direito o que fazer. Voltei de um belo passeio de barco, num lago que circunda minha casa. Estava frio, e o nevoeiro já estava cobrindo as plantas e o animais, prenunciando perigo pros que ali não pertencem. Não lembro por quê estava ali. Caí no lago. Não devia ter brincado com forças maiores do que as minhas que, aliás, são tão precárias neste momento.


O céu está vermelho. Isso é estranho, mas me dá uma sensação de calor que ajuda a aquecer meu pobre corpo, ensopado com água doce, a roupa coberta por musgo e ninféias. Sinto que alguém está por perto e que vai me agarrar pelas costas a qualquer instante. Pra isso, guardo dentro do peito um grito terrível, caso tal iminência deixe de sê-lo e se torne ato.


Corro. O ar gelado corta meus pulmões e bloqueia a passagem de meu grito.


De repente, estaciono. Meu corpo se desequilibra por não acompanhar a velocidade de meus pensamentos, e caio. Estacionei porque o sentido de correr simplesmente saiu de minha lógica, da ordem que sigo de dentro de mim. Pra quê, mesmo?


Os músculos tremem. Sinto os pés se torcendo por causa do esforço e do frio. Tento urrar de dor, mas não consigo. Me deixo deitar no chão, dobrado, com as mãos nos pés. Não há outra coisa a fazer além de chorar.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Mulher Narcísica

"Se perguntar a alguém quem sou
ouvirá mais de mil definições
escolha a que mais lhe interessou
e ela não lhe causará decepções.

Me veja como santa, como ré
me veja sonsa, sóbria, sagaz
pois eu me faço ver como quiser
e de tantos outros truques sou capaz.

Posso te enganar, te iludir
apunhalar seu coração sem prévio aviso
posso chorar e até te agredir
mas sempre ter no bolso um bom sorriso.

Pois quem sou só Freud explica
com um termo bem peculiar:
ele me chama Mulher Narcísica,
que só a si mesma sabe amar.

Mas não julgue o que não pode conhecer
não caia em ciladas -só nas minhas-
pois o destino desta mulher é padecer
do constante temor de estar sozinha."

(poema de julho de 2005)

quarta-feira, 26 de março de 2008

Ler o almoço e comer o livro (ou ajudinha do Chaves)


A Revista da Folha desta semana mostrou uma pesquisa sobre a leitura no Brasil. Não me lembro de onde eram os dados, mas a média do brasileiro no quesito leitura é de 1,8 livro/ano (!). Fiquei assustadíssima. Desde os 4 anos de idade, minha média é sempre bem maior! Ano passado, por exemplo, eu li uns 25 livros.

Claro que, talvez, eu não possa ser parâmetro -admito meu lado totalmente nerd e sei que a grande maioria das pessoas não é assim (Graças a Deus). Só que ler 1,8 livro é muito pouco pra 365 dias do ano -a situação só piora nos anos bissextos!

É claro que há muitas variáveis nesse dado. Das que eu posso dizer, estas são algumas:

1) O Brasil tem 200 milhões de pessoas, sendo que a renda $ se divide em cinco classes. É muita discrepância entre a classe A e a E;

2) Livros não são o bem de consumo mais barato. Pelo contrário, o preço não é muito acessível. Uma pessoa que ganhe um salário mínimo para pagar aluguel, contas, comida e transporte nem sempre pode gastar 30 reais num livro (para isso, há algumas soluções de outros países -por sinal, com menos classes sociais distintas- , como imprimir livros com papel de qualidade inferior e menores);

3) O investimento em bibliotecas públicas não é tão grande quanto o investimento nas bibliotecas privadas dos escritórios e living rooms das casas dos senadores;

4) O hábito de ler não é transmitido como algo prazeroso, mas sim como uma obrigação, tanto na escola quanto no trabalho;

5) As outras formas de lazer mais socialmente aplaudidas envolvem mídias como computador e televisão -enfim, cenários que você não precisa movimentar dentro da sua cabeça, porque eles se mexem sem sua interferência ou criatividade, contribuindo para uma futura demência precoce, ou algo assim, por causa do atrofiamento das sinapses. (É claro que estou sendo totalmente terrorista agora)

Não quero só apontar as causas, que são inúmeras e outras pessoas poderiam fazê-lo muito melhor do que eu. Quero também propor e pedir soluções. Acho que a solução aí (e, quando digo isso, fica claro que consideroum grande problema lermos tão pouco) tem que funcionar como o mecanismo do Chaves com o Kiko. Quando o Chaves aparecia com um pirulito, o Kiko ficava com vontade e aparecia com um maior ou com dois. Ou seja, a partir de um estímulo, ele sentia a necessidade. É assim que funciona a saída que proponho: aos que sentem prazer em ler, que não sejam egoístas e demonstrem isso aos outros. Dêem livros antigos, gibis que liam tempos atrás. Leiam livros no transporte público e façam cara de deleite a cada página avançada. Beijem os livros da biblioteca, espalhem cartazes de propaganda de sebos. Sentem no chão da Saraiva Mega Store mais próxima e leiam em voz alta. Promovam saraus (com ou sem diversões mais profanas inclusas). É claro que a vida é muito mais do que isso, mas ler é uma viagem cujos suvenires nós guardamos no lugar mais sagrado.

Obrigada por ter lido essa postagem que escrevi. O prazer foi meu. E seu também!

domingo, 23 de março de 2008

Páscoa (ou postagem polêmica)


[Imagem: "O sacramento da última ceia", Salvador Dalí]


Hoje é Páscoa.


Não sei explicar direito o por quê, mas esse feriado pra mim geralmente é meio triste. Não lembro uma páscoa em que eu, de alguma forma, não tivesse ficado meio chateada, nem que seja por uns instantes. Uma vez, comentei isso com uma amiga (por sinal, uma daquelas amigonas do peito, daquelas de infância e de coração) e ela me disse que seu pai também tem essa sensação. Achei engraçado e, desde então, nesta época, tento pensar nos motivos que fariam o pai de uma amiga e eu termos em comum essa sensação melancólica na ressurreição de Cristo.


Começando pelo mais óbvio -caro Watson-, posso pensar no próprio significado da Páscoa, explicitado ali no final do parágrafo de cima. Pensar que alguém ressucitou é, talvez, lembrar que a pessoa antes teve que morrer e, no caso, não foi uma pessoa qualquer nem uma morte qualquer; Jesus foi morto e crucificado. O fato de Cristo ter ressucitado para nos salvar envolve, no mínimo, dois sentimentos: gratidão e culpa. Daí poderia vir meu sentimento ruim. A amarga culpa, com gosto de babosa (nunca experimentei, mas meu avô disse que é amarga).


Fazendo o samba do crioulo doido, os dois sentimentos de que falei me lembram de uma psicanalista chamada Melanie Klein, bem menos conhecida que o paizão Freud, mas que pra nós é bem conhecida (e causadora de embates: ou você a ama ou a odeia). Outro dia -se pá -eu falo da vida dela, que é bem interessante. Mas hoje quero falar somente um ínfimo que sei de uma parcela da teoria dela sobre inveja e gratidão. Para Klein (grosso modo!), nós, quando bebês, sentimos inveja da mãe por ela ser portadora de tudo o que é bom: leite, calor e o amor do daddy. Dependemos dela, e isso é irritante. Resultado disso é a atacarmos de algum modo simbólico e sentirmos de volta essa agressão, sem percebermos que essa raiva, na verdade, está em nós mesmos. Isso acontece até sermos maduros o suficiente para nos darmos conta do que rola, sentirmos culpa e, conseqüentemente, gratidão por essa mamãe que nos mantém vivos. Aí passamos, diga-se, para um "estado mais elevado do ser". Isso acontece com (quase) todos nós.


Enfim, a Páscoa pode ser um momento feliz, por envolver um fato glorioso da bíblia e também, hoje em dia, por ser um feriado prolongadão. Mas ela também me faz triste. E ao pai da minha amiga também. Pode ser do nosso sentimento de culpa por não sermos perfeitos e, por isso, termos sido salvos por alguém muito melhor do que nós. Alguém pleno como a mamãe. Alguém a quem devemos gratidão enorme, pois, mais do que nos dar leite, nos deu sua vida. Pode ser também por muitos outros motivos.





Caracas, viajei nessa postagem... Deve ter sido overdose de chocolate!

quarta-feira, 19 de março de 2008

Saudade


[Imagem: Edvard Munch, "Manhã", ano ?]


Como muita gente sabe, "saudade" é uma palavra que não existe em outras línguas. Além disso (ou por isso), é também uma das mais difíceis de traduzir em outros idiomas. Assim, para passar para outro idioma, usa-se um número grande de palavras para tentar dizê-la.


Acho que, indo além do significado semântico, no qual se utiliza a linguagem, a saudade é muito mais difícil de exprimir em um mínimo -seja esse mínimo um mínimo de palavras, um mínimo de afetos, um mínimo de sensações corporais. Saudade é algo muito mais complexo do que o quanto em si mesma comporta, daí sua incompatibilidade com o que quer que seja mínimo, menor, limítrofe, pouco.


Saudade é muito. Não existe pouca saudade. Sendo assim, ela tem um quê de onipotência, de preenchimento, de plenitude. Ela é autótrofa, autóctone, auto-suficiente. Chega até a ser invasiva, tomando espaço de outros sentimentos -estes, geralmente mais traduzíveis. Ao mesmo tempo, a saudade pode ser um poço vazio. Um nada. Um silêncio, um hiato. Saudade é pura contradição.

... Será que uma postagenzinha conseguiu traduzir um mínimo do que ela é?

sábado, 8 de março de 2008

Dia das Mulheres

[Imagem: "Gala em esferas atômicas", Salvador Dalí. Não achei o nome orginal nem a data, mas é algo assim]


She can kill with a smile, she can wound with her eyes.
She can ruin your faith with her casual lies.
And she only reveals what she wants you to see.
She hides like a child, but she's always a woman to me.

She can lead you to love, she can take you or leave you.
She can ask for the truth, but she'll never believe.
And she'll take what you give her as long it's free.
She steals like a thief, but she's always a woman to me.

Ohhh... she takes care of herself.
She can wait if she wants, she's ahead of her time.
Ohhh... and she never gives out,
and she never gives in, she just changes her mind.

And she'll promise you more than the garden of Eden.
Then she'll carelessly cut you and laugh while you're bleeding.
But she brings out the best and the worst you can be.
Blame it all on yourself 'cause she's always a woman to me.

She's frequently kind and she's suddenly cruel.
She can do as she pleases, she's nobody's fool.
But she can't be convicted, she's earned her degree.
And the most she will do is throw shadows at you,
but she's always a woman to me.

(She is always a woman to me - Billy Joel)


*


Hoje é um dia muito especial pra todas nós, mas também o é só pra mim...

Mulheres são filogeneticamente e culturalmente rivais, mas hoje há trégua: Feliz Dia das Mulheres!

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Só pra constar...


Ai, que tristeza, não tenho conseguido parar pra escrevr no meu blog. Então estou fazendo um post sem nada de mais, só pra desencargo de consciência. Vou jogar aqui um desafio com o qual estou me deparando agora...


Você já escreveu sua auto-biografia?


Pois é... esta é minha tarefa de uma de minhas aulas de supervisão. Estou escrevendo minha auto-biografia pra uma psicóloga (fera) ler. Alguém já tentou? Se sim, ou se tentarem agora, me contem o resultado...

[Imagem: filme "Memórias de uma gueixa"]

domingo, 27 de janeiro de 2008

Quem conta um quadro... (ou pintando um conto)


Imagem: Henri Matisse, "Mesa posta (harmonia em vermelho)". Óleo sobre tela, 1908. 180x220 cm, Hernitage, São Petersburgo (Rússia).


Amélia terminava de arrumar a mesa para o café. Sua empregada havia acabado de colher as frutas, e a dona da casa fazia questão de arrumá-las pessoalmente nas bandejas que decoravam e coloriam os momentos de refeição familiar. O marido estava no banho, cuja água ela esquentara imediatamente antes de chamá-lo, para que não esfriasse em demasia. Ao longe, ela ouvia a filha mais velha praticar Stravinski no piano da sala de estar.

O dia se anunciava claro e tranquilo, um dia como muitos que já passaram. Amélia suspirou e, diferentemente da maioria das vezes, deu-se conta de que estava entediada. Seus suspiros eram geralmente seguidos de pensamentos preocupados sobre o que preparar para o almoço e para a ceia, ou com que amiga tomaria o chá da tarde, ou talvez no que estaria ocorrendo nos campos de batalha da Guerra. Mas, neste dia como outro qualquer, um súbito clarão lhe invadiu a consciência, fazendo com que interrompesse a arrumação das maçãs e laranjas.

O que faço aqui? Por quê devo arrumar estas frutas todos os dias, se elas logo apodrecem se não as comermos? Por quê tenho fazer algo que no dia seguinte terei que fazer de novo? Aonde essa repetição me levará? Amélia olhava para o nada enquanto perguntas e mais perguntas lhe vinham à cabeça, sem no entanto encontrar respostas convincentes. Mas, afinal, convencer-se de quê? Concluiu que não se sentia feliz, e isso bastava para que se obrigasse a mudar. Lembrou-se do marido e sentiu raiva por nunca ter sentido com ele prazer maior do que com qualquer pessoa. Lembrou-se de seu pai e da decisão tomada por ele e seu sogro de unir os dois filhos que sequer se conheciam. Lembrou-se de como se sentiu invadida e humilhada com o silêncio do marido, a ausência de palavras carinhosas que só sabia existirem por um passado distante, vindo à tona por breves momentos de música e alegria difusos. Pensando nisso, ouviu ao longe a música da filha, que agora cantarolava. A moça lhe dava muita alegria, com certeza, mas também lhe mostrava, cada vez mais, a presença inconfundível e indiscutível do tempo marcando-lhe o rosto, o pescoço, as mãos. Muitas vezes se viu sombria, comparando a vivacidade nos cabelos da menina e o olhar de desejo dos homens a um tempo que não lhe voltaria mais. Lembrou-se de sua mãe. Morrera cedo e, logo em seguida, morreu-lhe o marido. Amélia imaginava que ele se fora somente para que, onde quer que estivessem, continuasse a exigir a subserviência da mulher.

Um aperto lhe fez sentir o coração; vinha de um medo do futuro e uma urgência em consertar as coisas, um egoísmo nunca sentido. Gostaria de sair, de fugir. Olhou para a janela. De repente, tudo pareceu rodar e o ambiente foi dotado de um estranhamento, como se nunca tivesse ali existido. As coisas não pareciam estar em seus lugares. E, desta ausência de ordem, desta imposição caótica, submergiu em Amélia um temor ainda maior, o temor de fazer parte de tal absurdo e não pertencer a mais nada; de submeter-se irrefreavelmente ao vazio e, assim, deixar de ser.

Assustou-se. O marido lhe abraçou a cintura por trás, beijou-lhe o rosto e disse: feliz aniversário, Amélia. Não havia sorriso em seu rosto, mas talvez não o precisasse. Convidei alguns amigos nossos para o jantar, prepare algo especial. A filha chegou à mesa, abraçou a mãe carinhosamente: feliz aniversário, mamãe. Continua tão bela... e sentiu uma fresca admiração no olhar da filha.

Amélia sorriu. Tinha uma pequena felicidade em seu peito, e logo lhe veio a preocupação sobre o que servir no jantar de seu aniversário. Sem perceber, esqueceu-se completamente dos pensamentos que lhe haviam invadido minutos atrás, e voltou a se encerrar em seu doce mundinho de cores primárias.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Postage en español (o portuñol)

Hoy yo he decidido escribir en español. Las razones para eso son diversas, pero dos de ellas son 1) que tengo que practicar un poco (porque lo parco que sé está a herrumbrar) y 2) desde niña creo que algunas cosas son más fáciles de decir cuando dichas en otra lengua.

Tu me preguntas: ¿pero qué cosas, por ejemplo?

Para mí, el lenguaje es vital. El acto de comunicarse es inherentemente humano. Y eso no depende de hablar o de oír. Hay sutilezas que se perden en el medio de palabras y que solamente pueden ser resgatadas por otras maneras de expresión. Un sonrisa. Un movimiento de manos o de cabeza. Un sonido. Una mirada. Un rato en silencio. Una tonalidad de voz. Un imaje. Una simultaneidad. Y hay sentimientos y ideas que combinan mejor con una lengua específica. Para mí, el español el una lengua viceral -creo no haber palabra más perfecta para definirla. Para hablar de amor, de pasión, de víceras. De sentimientos profundos u oscuros, que ni siempre pueden ser dichos en otra lengua sin perder su fuerza. Talvez (y tengo casi certeza) el tango sea un ejemplo máximo de esa fuerza, pasión, en fin, todo lo que dijo arriba. Las formas de comunicación (de lenguaje) de una lengua están siempre conectadas. Y eso es lindo.

Pienso que ese postaje es una declaración visceral de amor a la lengua española.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Saramago (ou Postagem Preguiçosa)

Em março (ou maio?) vai estrear o filme "Blindness", versão cinematográfica do livro do José Saramago, "Ensaio sobre a cegueira". Eu já li o livro e tenho que recomendá-lo. A escrita do Saramago (ou nossa leitura do Saramago) nem sempre é muito fácil porque ele tem o hábito de encher páginas com um único parágrafo, às vezes com uma única frase! Mas vale muito a pena, é questão de pegar o jeito e se habituar.
Eu também li "A Caverna" e aqui vão dois trechos do livro:

“Autoritárias, paralisadoras, circulares, às vezes elípticas, as frases de efeito, também jocosamente denominadas pedacinhos de ouro, são uma praga maligna, das piores que têm assolado o mundo. Dizemos aos confusos, Conhece-te a ti mesmo, como se conhecer-se a si mesmo não fosse a quinta e mais dificultosa operação das aritméticas humanas, dizemos ao abúlicos, Querer é poder, como se as realidades bestiais do mundo não se divertissem a inverter todos os dias a posição relativas dos verbos, dizemos aos indecisos, Começar pelo princípio, como se esse princípio fosse a ponta sempre visível de um fio mal enrolado que bastasse puxar e ir puxando até chegarmos à outra ponta, a do fim, e como se, entre a primeira e a segunda, tivéssemos tido nas mãos uma linha lia e contínua em que não havia sido preciso desfazer nós nem desenredar estrangulamentos, coisa impossível de acontecer na vida dos novelos e, se uma outra frase de efeito é permitida, nos novelos da vida. Marta disse ao pai, Comecemos pelo princípio, e parecia que só faltava que um e outro se sentassem à bancada a modelar bonecos entre uns dedos subitamente ágeis e exactos, com a antiga habilidade recuperada de uma longa letargia. Puro engano de inocentes e desprevenidos, o princípio nunca foi a ponta nítida e precisa de uma linha, o princípio é um processo lentíssimo, demorado, que exige tempo e paciência para se perceber em que direção quer ir, que tenteia o caminho como um cego, o princípio é só o princípio, o que fez vale tanto como nada.” (pp. 71-72)

“...os sonhos humanos são assim, às vezes pegam em coisas reais e transformam-nas em visões, outras vezes põem o delírio a jogar às escondidas com a realidade, por isso é tão freqüente confessarmos que não sabemos a quantas andamos, o sonho a puxar de um lado, a realidade a empurrar do outro, em boa verdade a linha reta só existe na geometria, e ainda assim não passa de uma abstracção.” (p. 197)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Ousadia (ou Edgar Degas)


O último livro que li fala do Degas e de suas obras. Ele nasceu em 1834 e morreu antes da Primeira Guerra Mundial.

Ainda não disse isso, mas eu me interesso demais por biografias. Só que raramente guardo datas e lugares: cérebro "feminino" como o meu é, costuma guardar preferencialmente o modo como a pessoa foi, as relações que estabeleceu, as ligações de sua trajetória de vida com sua obra... enfim, impressões. E, para isso, nada melhor do que falar de um impressionista que foi Degas.

Não quero digitar o nome dele no Wikipedia e pegar dados que não lembro de cor (confesso que a idéia me veio à cabeça). Prefiro falar um pouco do que ficou pra mim a partir do livro. Degas, como a maioria dos artistas da época, era um boa-vida, ou seja, o pai tinha uma graninha razoável e isso permitiu ao filho escolher que profissão seguir. Ele se formou em outra coisa (Direito, acho -altas possibilidades de ter acertado. Naquela época as escolhas variavam em médico, advogado e banqueiro! Não tinha muito mercado pra um OV...) , mas resolveu ir estudar arte. Acontece que bum!, rolou um problema monetário e ele teve que começar a pintar para comprar o pão (ou o croissant, afinal, ele é francês) de cada dia. E foi assim que ele começou a pintar suas famosas bailarinas.

As bailarinas de Degas. Pra quem tinha a romântica visão de que ele as pintava por admiração, se enganou. Ele até curtia um balletzinho, mas toda a burguesia curtia (aliás, essa dança representava o "mercado de moças" para os burgueses bonachões, coisa que Degas repudiava). Assim, os quadros de Ed eram bastante procurados e ele garantia uns francos.

Enfim, qual a grande sacada do Degas: ele se inspirou, dentre outras coisas, na fotografia para compor suas obras. Assim, inovou no uso da luz artificial, nos temas e nos enquadramentos. Ele foi o primeiro cara a cortar um jóquei pela metade, deixar o braço da bailarina pra fora do quadro, a colocar no centro do quadro um vaso de flores ou um simples chapéu etc. E isso, somado, claro, ao seu talento, ajudava a dar movimento às pinturas, que parecem captar um instante de um continuum.

Ele não pintou só bailarinas (às quais, aliás, ele chamava de um nominho pejorativo que agora eu esqueci qual era). Retratou também mulheres que trabalhavam duro, como engomadeiras, e também banhistas. Mas não as banhistas em florestas idílicas como do Renoir ou do Manet que, aliás, era seu amigo e esteve no seu funeral (Degas morreu bem velhinho, quase cego por uma doença crônica e na sua lápide estava escrito que ele era alguém que "gostava muito de pintar"). Suas banhistas eram quase um voyeurismo, pois mostravam mulheres comuns como se estivessem sendo vistas do buraco da fechadura, em posições nada elegantes e com as belas perucas da época encostadas do lado da bacia de banho. Ele não era necessariamente um adorador das mulheres. Pelo contrário, dizem que o danado era machista e meio grosseiro também.

Bom, isso é um pouco do que li sobre Degas. Tem muito mais pra quem quiser saber. Queria eu ter sabido disso tudo antes de ter ido à exposição que teve no Masp ano retrasado. Já mencionei que ele também era escultor?

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

"Hoje uso este tempo
pr´o sentimento poder dar vazão.
Não que eu pudesse
mas é que parece ter boa razão.
A dor que me causas
me tira de casa, me rouba o chão.
E por mais que eu tente
tu és resistente em meu coração.
Questiono o amor
e se aquele torpor lhe é pura essência.
Pra onde este foi
se ele compõe sua vil aparência?
A máscara cai,
e com ela se vai minha vã resistência.
E então fico só,
acumulando pó em tua ausência.
Peço liberdade,
estranha vontade de nos entristecer.
Não me abdico de culpa,
mas minhas desculpas não vais merecer.
Hoje usei este tempo
pro meu tormento tentar esquecer.
Mas eu não sei te amar,
e me dói sacar que isso não pode ser. "
(30/05/2005)

Eu fiz este poema há dois anos e meio, mas como os poemas em geral, ele é eterno pra quem um dia se identificou com ele.

domingo, 13 de janeiro de 2008

O Diabo Veste Prada


Hoje assisti de novo ao filme "O Diabo veste Prada" (Fox, 2006). Não tenho muita paciência para rever filmes, talvez porque freqüentemente me surja a paranóia de estar desperdiçando algumas horas da minha vida numa reprise enquanto poderia estar vivendo algo inédito. Esta lógica, apesar de lógica, também é um pouco torta -porque a gente pode muito bem encontrar no filme detalhes e idéias que não tínhamos captado antes simplesmente porque não podíamos ou ainda não estávamos prontos para ver sob a nova ótica em questão e, assim, viver algo novo e que valha a pena.

Desta vez, assisti ao filme de olho em algumas coisas, não necessariamente em ordem: 1) as roupas maravilhosas, 2) a atuação da Anne Hathaway, com sutis, mas valiosos, trejeitos que compunham a personagem Andrea, e 3) quão 'normal' é encontrarmos Mirandas em nosso caminho. E é isso que faz com que, inevitavelmente, 99% de nós nos identifiquemos muito com a mocinha espevitada. Somos rodeados por satãs bem-vestidos (ou seja, em pele de cordeiro, se é que o ovino está in em casacos neste inverno europeu) que nos causam, inicialmente, medo, repulsa e, lá no âmago, admiração. É tentador. A Cá estava vendo o filme comigo e comentou: "Quem não ficaria deslumbrado com tudo isso?"; é verdade (vide meu número 1 ali no começo do parágrafo). A personagem da Anne despiroca, dá um bolo (tanto no sentido conotativo quanto no denotativo) no aniversário do namorado charmosinho, não resiste ao loiro-de-sobrancelhas-estranhas-porém-jornalista-que-ela-admira, dá um pelé na colega de trabalho e vai pra Paris. Ela passa o filme se justificando e negando o quanto estava sendo transformada. Já que estava no inferno, passou a abraçar o capeta. Mas, no fim do filme (spoiler!), por ironia do destino (ou não), foi uma frase da própria diabona que a faz abrir os olhos, e ela percebe que ainda dá pra reverter a situação. E aí é recompensada e consegue o emprego que tanto queria, de jornalista no New York Mirror.

Será que ela precisaria passar por tantas humilhações da toda-poderosa da revista Runway, virar o pé com aqueles saltos divinos, conseguir o manuscrito do Harry Potter 7 e nem poder dar uma folheadinha etc., pra conseguir ter sua lição aprendida e ganhar o prêmio final? Eu aposto que sim. E vocês?

Teste #1

Esta é minha primeira postagem no meu primeiro blog... tenho o direito de errar, né? Enfim, de qualquer forma não vou apagar estes primeiros caracteres digitados aqui. Hoje me sinto inspirada a escrever, e portanto quero deixar minhas palavras marcadas e carimbadas neste mundo.