domingo, 29 de novembro de 2009

Entubados (ou aguardando Alice de Tim Burton)


Em um dos (atualmente) raros momentos de "curta-seu-hobby", estava eu tocando violão, quando meu pai decidiu afiná-lo. Eis que vai ao computador, entra na internet, digita "youtube.com" e coloca na busca: "afinar violão".
Eu, que pareço mais velha que meu pai (digo isso não por achá-lo velho, mas sim pela contradição da frase), acho que não vai encontrar nada, e comento que os vídeos deveriam apenas mostrar propagandas de afinadores portáteis, ou algo que o valha. Eis que, do quarto de passar, ouço uma voz masculina explicando qual casa dedilhar para afinar a primeira corda, e então um som: dooong. E assim vai, mostrando passo-a-passo o processo que escuto desde pequena, que é o doce afinar das cordas, uma a uma, buscando a harmonia final.
Dei o braço a torcer, claro. Comentei algo como: dá pra achar de tudo aí hoje em dia, ao que meu pai concordou e, logo após conseguir que minha cantoria soasse menos desafinada por conta da afinação do acompanhamento, passou a procurar músicas das décadas passadas. "Como eram bonitas! As de hoje não dá nem pra aguentar".
Foi então que me lembrei da minha busca, no ano passado, por algo como "pontos de tricô": realmente encontrei diversas aulas, que não substituiriam um professor ao vivo (como minha tia, que me ensinou de modo muito mais preciso as laçadas e os nós na lã), mas servem pra quem tem mais disposição e persistência para rever o mesmo vídeo on and on do que tempo ou contatos sociais para tomar umas aulinhas.

Pensando assim, vale muito a pena! Em uma busca rápida, encontrei vídeos que ensinam como "lavar os cabelos", "depilar perna", "tirar respingos de tinta da pintura do carro", "dançar macarena", "desenhar sketches", "tirar fotos", "fazer sorvete" e por aí vai. E, claro, também é possível disponibilizar seu próprio vídeo e ensinar à humanidade algo que seu talento domina, ou simplesmente que você ache importante que os outros vejam (ou não). Eu mesma - lembrei agora! -, tenho uns três vídeos disponibilizados, inclusive com a tal da cantoria...

Fato é que, em tempos de youtube, dá pra se ver de tudo: se o céu é o limite, esse céu é a imaginação de cada um. E ela pode nos levar a caminhos tão intensos quanto um filme de Tim Burton. É isso que tanto atrai quanto apavora quando sabemos que temos tanto poder ao alcance dos olhos.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Feriado


Hoje é feriado. Geralmente, o que perguntamos na véspera de cada um é: "O que fazer no feriado?", mas dificilmente nos lembramos primeiro das obrigações de cada data que se aproxima; já planejamos direto nossos prazeres, a viagem pra praia, o que levar ao sítio, aqueles filmes da Mostra, etc.

Hoje é dia de Finados. Nunca vi nenhuma pesquisa sobre o tema, mas acredito que, a cada ano, menos pessoas vão primeiro aos cemitérios e rezam uma missa para, somente depois, descer a serra. Por que isso acontece?

As respostas devem ser múltiplas. Desde as desculpas - falta de tempo; o trânsito que leva pra chegar aonde queremos já ocupa metade do lazer; stress; morar longe; ser fora de mão; ser fora de moda. As outras respostas, que esbarram mais em questões sócio-culturais, sugerem o abandono de hábitos, costumes, rituais, antes tão necessários.

Os rituais de passagem, como os velórios, as rezas, começaram a existir pela dificuldade (assim entendem os antropólogos) de lidar com a morte, inerentes ao homem - tanto a morte quanto a dificuldade. Assim, fazer oferendas, dedicar um lugar especial ao corpo, celebrar são formas de tornar a morte mais "palpável", mais "significável" - mais "controlável", no fim das contas. Fazer rituais, portanto, seria ter um mínimo de rédeas em algo que tanto nos assusta.

E será que, hoje em dia, realmente não precisamos mais deles? Será que conseguimos uma forma superior de lidar com o inevitável, elaboramos a coisa de um tal jeito que já entendemos o ininteligível? Ou será que simplesmente nos deixamos levar por outros interesses menos nobres e mais imediatistas, deixando de lado obrigações que nossos antepassados, há tanto tempo, sentiram necessidade de cumprir?

Para as crianças de hoje, que desde cedo entram em contato com cenas violentas de filmes de terror e de noticiários da vida real, não acredito que seria menos produtivo ir ao cemitério, com sua família, visitar os que já se foram. Saber um pouco, quem sabe, da história dos que estiveram aqui antes dela, e que, por isso, ajudaram a tornar o mundo do jeito que lhe foi apresentado ao nascer. Ou, ao menos, se familiarizar com os sons dos cantos nas capelas, o cheiro dos incensos, o silêncio dos túmulos. E, então, com as velas acesas, juntas as palmas das mãos e agradecer pela proteção e pelas bênçãos, e desejar que estejam em plena paz e serenidade.