quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Sobre vampiros e lobos (ou Por que gosto de Crepúsculo parte I)


Os livros da escritora americana Stephenie Meyer, "Crepúsculo", "Lua Nova", "Eclipse" e "Amanhecer" (este ainda não lançado no Brasil) têm sido o fenômeno de vendas e, conseqüentemente, de notícias em sites e de bilheteria (o primeiro filme estreou em dezembro).

A série narra a história de Bella, uma adolescente comum que vive na chuvosa e sombria cidade de Forks e se apaixona por um colega de sala misterioso, Edward. Ela logo descobre que ele é um vampiro e, com isso, dotado de características como: ser incrivelmente forte; ser incontestavelmente ágil; não poder sair no sol pois sua pele clara e gelada como pedra ofuscaria a visão; não comer; não dormir; ter mais de 100 anos (vai à escola pra disfarçar, já que foi transformado aos 17 anos); e conseguir ler os pensamentos de todos ao seu redor, menos os dela.

O amor que nasce entre os dois é cheio de percalços -primeiro, ele tem dificuldade em resistir ao odor extremamente adocicado do sangue da menina e, por isso, tem medo de feri-la; depois, ela deseja se tornar uma vampira, assim como Edward e sua família, mas ela também tem sua família pra deixar pra trás; além disso, ela ainda consegue se envolver com uma alcateia de lobisomens, dentre eles seu melhor amigo, Jacob, um rapaz da colônia indígena. Lobisomens são inimigos naturais dos vampiros. E essa inimizade aumenta quando Jacob deixa transparecer suas segundas intenções com Bella, deixando-a bem confusa -ainda que negue este fato -entre um vampiro caucasiano, gélido, romântico e de traços perfeitos e um pele-vermelha divertido, quente e cheio de pegada amigo-lobisomem (que só deixa de ser humano em momentos de muita fúria).

Acho que está bem claro, pelo tamanho da minha descrição, que sou fã da série. Estou no último capítulo do terceiro livro, pensando em ler o quarto em inglês, como já fiz com o segundo (sob patrocínio da minha prima, Cá, hehe) . Sem querer cair na comparação óbvia entre estes livros e os da J.K. Rowling (que, pra começar a diferenciar, é inglesa, diferentemente da Meyer), prefiro falar sobre aspectos particulares desta história de amor e fantasia, partindo da minha experiência pessoal e, claro, da Psicologia.

Contardo Calligaris, psicanalista, escritor e colunista da Folha de São Paulo, escreveu sobre o assunto (bom entendedor, ele já leu os quatro livros!). Ele indagou quais seriam os motivos para histórias de vampiros, vez ou outra, ressurgirem com toda a força no imaginário do povo (especialmente, talvez, os jovens) e lotarem as estantes de locadoras e livrarias com imagens de seus olhos sedutores e dentes afiados. E, então, deu sua leitura sobre a atração por estes seres míticos, leitura tal que me fez pensar bastante até que eu pudesse colocá-la aqui no meu Infinito e, ainda, acrescentar alguns pensamentos meus.

Dada minha descrição anterior sobre Edward, podemos ao menos prever que ser um vampiro corresponderia a uma grande ajuda e alívio na vida de um adolescente: é praticamente invencível frente a qualquer inimigo; tem um corpo perfeito que não muda a todo instante e, mais do que isso, 1) não precisa ser satisfeito com necessidades como tomar banho, comer, dormir, e 2) é imortalmente perfeito, eternamente jovem e vigoroso, não envelhece jamais; é sedutor e conquista quem quiser; é noturno (quem nunca voltou do colégio e capotou no sofá a tarde toda, sem conseguir dormir depois por ficar no msn?); é cheio de segredos que simples humanos não poderiam entender.

Mais do que desejo de ser como um vampiro (ideal de ego, ou de self), há uma identificação com o vampiro: nos sentimos, muitas vezes, tão invencíveis quanto eles, achamos (negando o que é real) que coisas ruins não vão acontecer conosco, pois nossa grama é que é a mais verde.

E os lobisomens? Calligaris não chegou a comentar sobre eles (provavelmente porque ele é menos enxerido do que eu, que já estou adiantando o segundo filme, "Lua Nova", ainda sem previsão), mas penso que eles também sejam um outro lado da adolescência. Quando se vira lobisomem, o corpo fica mais forte e cheio de pêlos, os sentimentos de fúria e emoção intensos são freqüentes e podem causar estragos, dorme-se muito e a temperatura é muito "quente" (como os hormônios muitas vezes nos deixam...). A comunicação entre os lobos de uma alcateia, mais do que verbal, é pelos pensamentos. A psique coletiva domina o grupo, pensa-se não individualmente, mas em conjunto. Não é a imagem do grupinho uniformizado que vemos atravessar a rua, divertido, no horário do almoço?

Acho que é fácil se identificar assim com a personagem principal: alguém que oscila entre o desejo mais intelectualizado e maduro de se fundir com um alguém que personifica o ideal de perfeição (e toda a mesmice e não-me-toques que ela pode trazer) e o desejo mais instintual e infantil de se divertir o mais livremente possível, sem amarras ou códigos de lei. Não é à toa que dizem que a adolescência é o intermezzo entre a criança e o adulto, mas que, (in?)felizmente, não há um Muro de Berlim que separe um do outro. Pelo contrário, é a contradição e a contravenção que definem a adolescência. É tudo o contra. O contra do quê? Confuso. Difuso.
***

Além da intensidade dos personagens, claro, é importante considerar o jeito de contar a história: Meyer coloca Bella como a narradora, e através dela sabemos todas as confusões que permeiam seus diálogos com o pai, com o novo amor, com os amigos do colégio (junto com os quais ela se sente pouco à vontade, tão atraída que é pelo que é diferente, misterioso e até sobrenatural). Vemos suas mudanças de atitude, nem sempre as mais certas ou sensatas, geralmente seguidoras de suas emoções. Bella faz rir, dá raiva, seduz, envergonha, causa inveja... Mas aí já é assunto pra próxima postagem.

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